sábado, 28 de março de 2009

Desmandos Financeiros das Repúblicas

J.G.Beccari (*)

Em tempos de reforma tributária, não se cogita da redução da carga tributária sob o pretexto de sua necessidade para a manuntenção do hiperdimencionamento do estado brasileiro.

Mas a verdade é que, o regime republicano, além de cumprir mal as necessidades do bem comum da Nação, se caracteriza, também, pelos conhecidos desmandos financeiros.

Quem ainda não teve o desprazer de comparecer a um órgão público? Os móveis estropiados, a falta de material, o atendimento geralmente displicente... Algumas raras exceções, pagas a peso de ouro (ouro dos contribuintes, é claro!) apenas confirmam tal regra.

Com efeito, o mau trato da “coisa pública” é praticamente inerente à natureza humana. Diz o

ditado popular: “o que é de todos não é de ninguém.”

Assim, no regime republicano em que, por definição, os bens públicos são de todos, eles são maltratados, desperdiçados, descuidados. E isto será mais verdade à medida em que mais bens sejam públicos. Os países socialistas em que a propriedade pública predomina são o exemplo clássico.

Mas, um dos maiores problemas que aflige os regimes republicanos, é o dos desmandos financeiros. São os chamados “ralos”, por onde o dinheiro público escoa com conhecida facilidade.

Vejamos, primeiramente, os óbvios problemas que as obras e compras promovidas por órgãos públicos apresentam nesse sentido. Todos sabem que seus orçamentos costumam atingir de duas três vezes (quando não mais...!) o custo verdadeiro dos bens e serviços licitados, ainda que seja por mera garantia contra atrasos nos pagamentos...

As obras e serviços prestados pela própria administração não são melhores porque padecem da ineficiência e findam por custar muito mais ao bolso do beneficiário (o contribuinte). Os quadros exagerados de pessoal, muitas vezes de uma dedicação não mais do que parcial, encarecem sobremaneira os resultados. Nem se diga da morosidade... Daí porque as empresas privadas são sempre muito mais enxutas e eficientes.

Por fim, a máquina administrativa do fisco consome a maior parte dos tributos para manter (não somente os agentes arrecadadores, mas as procuradorias, os tribunais de impostos e taxas, os órgãos do Poder Judiciário estadual e federal, etc.). Mais de 50% da arrecadação é gasto na própria atividade arrecadatória. Tudo isto sem contar o pesadíssimo encargo para as empresas se manterem atualizadas e recolherem corretamente tais tributos, além da verdadeira indústria jurídica que gira em torno do Fisco tanto para assessorar as empresas como para livrá-las dos desmandos do Poder Público e dos legisladores...

Ah! Os legisladores! Focalizemos um outro aspecto: o dos gastos do Poder Legislativo.

A remuneração direta e indireta dos parlamentares brasileiros torna o Poder Legislativo Federal, Estadual o mais dispendioso dos Poderes.

Tais salários são copiados proporcionalmente pelas Assembléias Legislativas estaduais e pelas Câmaras Municipais de todo o Brasil, a tal ponto que grande parte do orçamento dos Estados e de Municípios é destinada a estes órgãos.

As despesas para manutenção dos mais de 500 parlamentares (Senado e Câmara) atingem bilhões de reais, ou seja, vários milhões por cargo. No nível estadual e municipal, tais gastos exagerados também se repetem. Não são somente despesas diretas, mas também polpudas aposentadorias que aquinhoam os funcionários públicos destes órgãos.

Tudo isso para quê? Para quase nada. Sim, não bastasse o inextricável “cipoal” de leis que tornam impossível a vida do cidadão, um número muito maior de projetos é proposto pelos legisladores e é rejeitado como “lixo”: é o chamado “entulho legislativo”. Um exemplo contundente de tal realidade são os gastos despropositados, decorrentes da convocação extraordinária do Congresso Nacional.

No Império do Brasil, as funções parlamentares e legislativas, em todos os níveis, eram, o mais das vezes, exercidas gratuitamente, tão somente pela honra do cargo e pelo dever moral de servir ao bem comum. A figura do político profissional era uma excrecência.

Aliás, a coisa pública era tratada com cuidado. O Estado limitava-se a suas funções essenciais e as cumpria bem e parcimoniosamente. A diferença entre a menor remuneração (a de um escravo liberto) e a maior (de um desembargador) era de apenas 12 vezes. E não se diga que se tratava de um caso isolado e de tempos passados entre as monarquias.

Ainda hoje, na rica Inglaterra, é conhecido o fato de que parlamentares menos favorecidos moram em pensões nas proximidades do Parlamento e vão de bicicleta para as sessões...

O fato é que, se o Brasil almeja o florecimento econômico, deverá, necessariamente, reduzir sua máquina pública ao essencial e diminuir proporcionalmente os tributos que praticamente inviabilizam as empresas e a própria economia nacional. O essencial como defesa nacional, poder judiciário, diplomacia, etc. deve ser mantido e bem remunerado. Os demais serviços podem ser privatizados ou reduzidos ao mínimo, com mais eficiência. Os desvios que restam serão coibidos, pela força moral do monarca cujo mote é “servir ao povo” e não “servir-se do povo” como soe acontecer com os políticos profissionais nas repúblicas...


(*) advogado e presidente da Pró Monarquia



Fonte: Herdeiros do Porvir, n. 13, publicação da Pró Monarquia http://www.monarquia.org.br/

terça-feira, 10 de março de 2009

Editoral de Herdeiros do Porvir

Editoral
de Herdeiros do Porvir


No.
1 – setembro de 1995





Para bem compreender o futuro que nos aguarda, às portas do 3o.
Milênio da Era Cristã, nada melhor do que lançar
um olhar retrospectivo aos 200 anos que, em números redondos,
nos separam da Revolução Francesa de 1789.


Certamente não somos, nem poderíamos ser, daqueles que ao verem
evovado o regicídio de Luís XVI e de Maria Antonieta,
manifestam um sentimento selvagem de alívio, como se tal
acontecimento tivesse sido um ato de justiça histórica.
Não somos igualmente daqueles saudosistas que, segundo a
espirituosa expressão de um norte-americano, ainda perdem o
fôlego ao considerarem o trágico fim desse rei tão
condescendente e dessa rainha tão encantadora. Somos, isso
sim, daqueles que têm profunda consciência de que certos
problemas do passado são problemas continuamente vivos e que,
ainda hoje, a Revolução Francesa tem grande parte na
psicologia e no acontecer político, não só dos
próprios franceses, mas de todos os povos, ainda quando esse
acontecer político não tenha sido acompanhado pelos
rios de sangue de que nos fala a história de então.


O martírio dos reis cristianíssimos marca, de um ponto de
vista histórico, o começo de um movimento universal de
demolição que, como um tufão, vem abalando as
leis, as instituições e os costumes do glorioso
Ocidente cristão.


A Revolução que se desencadeava a partir da França,
então a capital cultural do mundo, procurou eliminar o ponto
ordenativo da ordem social e, como ele, as concepções
religiosa e política correlatas.


Sem ir mais longe, foi esse mesmo espírito que animou o movimento
que, no Brasil, derrubou, um século mais tarde, o trono dos
Braganças.






*
* *






Não se atenta contra a cabeça e princípio da ordem social
sem que as consequências as sofra todo o corpo. O que os
útimos 200 anos deixaram patante pe precisamente esta verdade:
A Revolução não parou não se esgotou nos
paroxismos do Terror. Ela foi-se desdobrando de modo a irradiar-se
por todo o corpo social.


Em seus aspectos essenciais, a histpória que começou a ser
escrita na França, mas cujas consequências são de
alcance universal, identifica-se com o surgimento, apogeu e ocaso de
um imenso e universal movimento de idéias, estilos de vida,
sistemas artísticos, instituições políticas,
sociais e econômicas. Um movimento ora violento e ostensivo,
ora pacífico e camuflado, mas sempre destrutivo.


Essses acontecimentos históricos, da França de 1789, marcam,
pois, o começo de uma Revolução no mais amplo
sentido do termo, uma Revolução total e de grande
alcance que já no início, como bem o expressou um de
seus cabecilhas, Rabaud de St. Etienne, visava todas as manifestações
do homem. É preciso, dizia, “mudar as idéias,
mudar as leis, mudar os costumes, mudar os nomes, mudar as coisas,
mudas as palavras, destruir tudo”.






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* *






Entretanto, é necessário ter em consideração que os
problemas suscitados pela Revolução Francesa não
abarcam em si todo o movimentar da Revolução hodierna.
Essa Revolução se desenvolveu e metamoforseou, e
propõe, hoje, de modo explícito, uma modificação
de tudo.


Despudoradamente o relevou Herbert Marcuse, filósofo da rebelião de Maio
de 68 e expoente da chamada neoRevolução: “Devemos
alcançar as raízes da sociedade nos próprios
indivíduos. Hoje a mudança qualitativa, a liberaççao,
implica mudanças orgânicas de instinto e biológicas,
ao mesmo tempo que mudanças políticas e sociais.
Pode-se indubitavelmente falar de uma revolução
cultural, já que o protesto está voltado contra todo o
Estabelecimento cultural, incluindo a moral da sociedade existente.
Há uma coisa que podemos afirmar com segurança:
acabaram-se a idéia tradicional de revolução e a
estratégia tradicional de revolução. Estas
idéias são antiquadas. O que devemos empreender é
uma espécie de difusa e dispersa desintegração
do sistema” (*).


Trata-se, portanto, da introdução silenciosa e subreptícia
de germes de demolição na própria raíz de
cada uma das manifestações da atividade humana, de modo
a que nada do que é humano lhe escape. É, pois, uma
Revolução Cultural.


“A expressão revolução cultural – segundo
Pierre Fougeyrollas, outro expoente desta neo-Revolução
– significa verdadeiramente uma revolução das
maneiras de sentir, de atuar e de pensar, uma revolução
de maneiras de viver (coletivamete e individualmente), em suma uma
revolução da Civilização” (**).


Uma Revolução, portanto, que se diz Cultural para indicar a
amplitude e a periculosidade de seu poder demolidor.


Cultura é sinônimo de aperfeiçoamento. Cultivar, seja o
espírito seja a terra, é aperfeiçoar, tornar
frutífero, belo e harmonioso.


A Revolução Cultural, pelo contrário, visa tirar
dos eixos as coisas, tornando-as estéreis, desproporcionadas,
imperfeitas, dissonantes. Numa palavra, voltar as coisas contra seu
fim natural.






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* *






Para que o ideal monárquico continue integralmente aquilo que
sempre foi, mas, por outro lado, não se fossilize na
imobilidade e em polêmicas, por vezes, um tanto peremptas e até
estéreis, é necessário compreender a contínua
metamorfose desta Revolução universal.


É evidente que as novas fórmulas revolucionárias, que
encantariam os regicidas de 1789, mas que eles não ousariam
explicitar – ou talvez não souberam explicitar –
apontam para a meta visada por todos eles. Ou seja, oa anarquização
de tudo, a subversão total, o caos absoluto.


O objetivo de tal Revolução é o nihilismo, reduzir
a nada e confundir no caos mais completo tudo aquilo que a
civilização e a cultura cristãs – frutos
preciosos do sangue de nosso Divino Redentor – levaram a seu
esplendor.


Esse fim, poucos o expressaram com tanta clareza quanto Marx, o qual num
“arrobo místico”, possuído pelo espírito
de destruição, exclamou: “Ao mundo que se levante
entre mim e o abismo o farei pedaços com minhas maldições
perduráveis, ainda que arrate o mundo à ruína.
Lançarei os braços ao redor de sua áspera
realidade: abraçado a im, o mundo perecerá caladamente,
e logo se afundará no nada absoluto” (***).


É a tal fim anarquizante que vai chegando paulatinamente a realidade
contemporânea. Os atentados de Osaka, Oklahoma ou Medellín,
tal como a escalada do terrorismo integrista muçulmano a nível
mundial, não são senão uma mostra disto. Por
outro lado, a insegurança e a crescente situação
indefesa da sociedade perante a expansão da indústria
do roubo, do sequestro e do tráfico em grandes cidades como o
Rio ou São Paulo, constituem outros sintomas de uma sociedade
em decomposição e que se dissolve no caos.


Para não falar do alastramento de aberrações morais
como o homossexualismo e a generalização do aborto,
essa violenta e brutal transformação do, por natureza,
fértil e protetor seio materno em estéril câmara
de tortura e de morte de inocentes, aos quais se nega a mais
elementar acolhida. Aberrações a par das quais não
é de estranhar que brotem outras como a do parricídio e
da autanásia, em que os filhos não desejados têem
como contrapartida os pais e os velhos não desejados.






*
* *






Hoje em tida, pois, a Revolução Cultural põe em jogo,
não só o sim ou não a respeito das formas de
governo, Monarquia ou República, mas o sim ou não a
respeito de tudo: do Estado institucional ou da pulverização
anárquica do corpo social; da instituição
tradicional da família ou das formas aberrantes de sociedades
ditas “conjugais” entre pessoas do mesmo sexo; da moral
ou das formas mais indigestas e convulsivas da imoralidade....
digamos tudo em uma palavra só: da crença absoluta em
um Deus pessoal ou o do relativismo e do ateísmo completos.


Para nós, é de capital importância ter noção
de que os que vêem, no conjunto de problemas levantados pela
Revolução Francesa de 1789 as únicas facetas da
Revolução hodierna. Estão fora do tempo. Como
igualmente fora do tempo estão os que se arrepiam de pânico
quando consideram que, hoje em dia, até mesmo entre os jovens,
há admiração por instituições como
a nobreza ou a realeza, e se tem saudades de figuras, como por
exemplo, a de D. Pedro II.


É preciso compreender que, atualmente, se detectam na opinião
pública dois movimentos profundos e que caminham em sentidos
diametralmente opostos. De um lado, o daqueles que tendem a chegar
aos paroxismos últimos desta Revolução Cultural
acima descrita. De outro, cada vez mais numeroso e mais pujante, o
daqueles que dão sinais inequívocos de se estarem
libertando da escravidão às utopias e mitos
igualitários, ao mesmo tempo que começam a voltar-se
admirativamente para o glorioso passado cristão, buscando os
valores de ordem natural e sobrenatural que o inspiraravam e lhe
conferiram grandeza inigualável.


Portanto, acima da crise, do caos e da confusão generalizada, vemos o
ideal de Civilização Cristã não como um
valor ultrapassado, mas com oum farol que nos indica um porvir
glorioso do qual somos chamados a ser os herdeiros.


Como Herdeiros do Porvir, para contrarrestar essa imensa avalanche
da Revolução Cultural, devemos ir semeando por todas as
partes os perenes e sempre novos ideais da Civilização
Cristã que, como germes de uma Contra-Revolução
Cultural, reorientem os espíritos e os corações,
para essse movimento ascencional rumo à perfeição,
em todos os âmbitos da vida.


É com essa meta que iniciamos esta publicação, qual desde
já colocamos aos pés da excelsa Padroeira e Rainha do
Brasil, Nossa Senhora Aparecida, uma vez que temos bem vincada em
nossas almas a certeza de que nada de grande e de sólido se
constrói sem a indispensável ajuda da Providência.


(*) La sociedade carnívora, ed. Galerna, Buenos Aires, 1969, 2a. ed
(**) Marx, Freud et la révolution totale, Anthropos, Paris, 1972.}
(***) apud D. Cardozo, in “Boletín de Ciencias Politicas y
Sociales”, Mendonza, Argentina, n. 22, 1978, p. 53.


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www.herdeirosdoporvir.blogspot.com

segunda-feira, 2 de março de 2009

A Crise Atual e a Economia em uma Sociedade Orgânica


A Crise Atual e a Economia em uma Sociedade Orgânica


J. G. Beccari*


A crise que se abateu sobre a economia capitalista pôs à mostra os pés de barro da sociedade industrial e globalizada moderna, a ponto de alguns pregarem a socialização do Ocidente,através da estatização de bancos e grandes empresas e a instauração de estritos controles e regulamentos sobre os demais entes econômicos. As grandes corporações modernas, onde o controle é difuso e o poder está em mãos de pessoas descompromissadas com os detentores do capital, estão a um passo da socia-
lização.

Ora, depois do estrondoso fracasso do socialismo, caracterizado pela pobreza ainda reinante nos países que teimam em mantê-lo, como a Cuba de Fidel Castro, seria um erro ainda maior cair nessa tentação.Ademais, à luz da doutrina cristã, o socialismo é de si ilegítimo ao preten-der estabelecer entre os homens uma sociedade igualitária, que afronta a ordem natural e que nega a propriedade privada objeto de dois Mandamentos da Lei de Deus: “Não roubarás” e “Não cobiçarás as coisas alheias.”

Qual é então a solução? Faz-se necessário entender as causas do pro-blema. Os economistas de todos os naipes divergem sobre isso. Limitam-se a constatar que a produção exagerada de bens, vendidos através de insidiosas campanhas de marketing, com o financiamento temerário de instituições financeiras, tudo isso aliado ao desejo incontido de lucro rápido de muitos consumidores, levou à formação de “bolhas”.

A verdade é que no âmago das crises as tendências desregradas do homem moderno. Especialmente quando se verifica que o homem de hoje deixou de ter uma razão mais elevada para sua exis-tência e de se preocupar com seu aperfeiçoamento moral e espiritual. Passou a viver o “aqui e agora”, tentando “tirar vantagem” de tudo, olvidando-se de suas obrigações para com Deus, para com sua família e até para consigo mesmo...

A hierarquia e o respeito na sociedade moderna não se pautam mais pelo critério do valor pessoal e do serviço ao bem comum, mas tão somente pela posse de bens materiais, dando, por vezes, lugar de proeminência a elementos amorais da burguesia abastada, quando não a oportunistas de duvidosa formação.

Além disso, a globalização, que transfere a produção industrial e a prestação de serviços para países longínquos, ins-táveis ou mesmo dominados por ditaduras socialistas, torna as economias dependentes de fatores extrínsecos ao controle local.

O capitalismo, sob a égide dos princípios da propriedade privada, da livre iniciativa e do respeito à função subsidiária do Estado, que, ao contrário do socia-lismo, é de si legítimo, se presta a abusos quando desvinculado dos princípios morais e cristãos. Abusos estes que contém o gérmen da atual crise ao colocar em primeiro plano a busca desenfreada do lucro como finalidade última e exclusiva da atividade econômica.

À vista do acima exposto, ousamos dizer que, se, no campo político, a restauração da ordem implica na volta da monarquia numa sociedade familiar e aristocrática, no campo econômico, a solução da crise está no retorno do homem a uma impostação perante a vida que coloque, verticalmente, Deus acima de todas as coisas e, por conseqüência, coloque o seu desenvolvimento moral e espiritual acima dos bens materiais. Diz o Evangelho: “procurai, antes de tudo, o Reino de Deus e a sua Justiça, e o resto todo vos será dado por acrés-cimo.”

Uma sociedade sacral, onde todos estivessem voltados para atingir o seu fim último, ordenaria automaticamente o consumo e a produção para suprir as legítimas necessidades do homem, sem cair em exageros ou desequilíbrios. O homem voltado para Deus e mais centrado em si e no seu próximo seria tendente a aproveitar e garantir o que possui. Deixaria de se voltar para o lado, horizontalmente, procurando vantagens mirabolantes, por vezes em outras pessoas,em outras situações pessoais ou em locais distantes.

Assim, as necessidades do homem bem ordenado seriam atendidas antes de tudo pelo seu trabalho e pelos bens produzidos por produtores próximos que se utilizariam da matéria prima e mão de obra locais, desenvolvendo ao máximo as potencialidades regionais, sem a dependência de fatores externos, fora de seu controle. A estabilidade daí decorrente, tal como nas antigas fazendas nas quais quase tudo se produzia internamente,
é evidente.

A produção visaria primordialmente atender as necessidades dos consumidores. A qualidade e o requinte dos bens teriam prioridade em relação à quantidade. O lucro pela produção proporcional àquelas necessidades garantiria ao produtor e à sua família uma vida condigna e a melhoria de sua situação pessoal. Os consumidores, por seu turno, se limitariam a adquirir aquilo de que necessitassem, dentro de suas possibilidades.

Tal sociedade seria ordenada hierarquicamente em função do serviço de seus membros à Igreja e ao bem comum, e não somente em função da riqueza. Isso colocaria em seu devido lugar as tendências humanas, desregradas por natureza.

Tal sociedade não é utópica como poderia parecer à primeira vista e já existiu na História, na Idade Média. Na Encíclica Immortale Dei, Leão XIII des-creveu nestes termos a Cristandade medieval: “Tempo houve em que a filosofia do Evangelho governava os Estados. Nessa época, a influência da sabedoria cristã e a sua virtude divina penetravam as leis, as instituições, os costumes dos povos, todas as categorias e todas as relações da sociedade civil. Então a Religião instituída por Jesus Cristo, solidamente estabelecida no grau de dignidade que lhe é devido, em toda parte era florescente, graças ao favor dos Príncipes e à proteção legítima dos Magistrados. Então o Sacerdócio e o Império estavam ligados entre si por uma feliz concórdia e pela permuta amistosa de bons ofícios. Organizada assim, a sociedade civil deu frutos superiores a toda expectativa, cuja memória subsiste e subsistirá, consignada como está em inúmeros documentos que artifício algum dos adversários poderá corromper ou obscurecer”.

A hierarquia social da Idade Média era encabeçada pelo clero, cujo direi-to provinha da doação de si mesmo à religião – clero este que tinha por incumbência, ainda, prover as duas mais dispendiosas atividades do Estado moderno, a instrução e a saúde, através das escolas e hospitais mantidos pelos religiosos. A seguir vinha a nobreza, tributada com o chamado “imposto de sangue”, decorrente do serviço militar à nação, e incumbida, ainda, de prestar a Justiça e da segurança interna. Por fim vinha o povo que, dispensado da guerra, podia se dedicar comodamente ao comércio e à produção, atendendo às necessidades materiais da sociedade, mas tributário da nobreza.

A partir do Renascimento e do Huma-nismo a religião deixou de ser o centro da existência humana, que passou a ser ocupado pelo próprio homem. Homem este que, embora acumulando riquezas de maneira lícita, pois fruto de seu trabalho e engenho, já era dominado por suas paixões sem os limites da moral. A burguesia, levada por ideólogos revolucionários, a pretexto de possuir fortuna, passou então, de maneira indevida, a reivindicar a direção da vida pública, culminando com a Revolução Francesa.

A Revolução Industrial não foi senão um seguimento do movimento tendencial de acumulação ilimitada de riquezas. A produção em massa, em que a quantidade e o lucro se sobrepõem à qualidade e ao atendimento das necessidades dos consumidores, alterou o foco da economia. Seguindo os preceitos de Adam Smith, a produção deixou de ser regional e proporcionada às necessidades locais. A propaganda passou a induzir ao consumo, às vezes muito além da zona natural de influência dos produtores e das próprias necessidades dos consumidores. Daí para a globalização foi apenas um passo a mais...

Temos, ainda, a indução à urbanização. Quebra-se a organização social familiar e patriarcal, ligada sobretudo à terra, que era de si mais condizente com a natureza humana. A família moderna, urbana, passa a ser nuclear (pai, mãe e um ou dois filhos) subordinados à ditadura dos meios de comunicação de massa. A previdência social e o amparo aos doentes deixam de ser feitos pela família e passam ao Estado.

Dispensamo-nos, aqui, de abordar o tema do empobrecimento cultural resultante da produção industrial em massa e globalizada, o que é objeto de estudos de diversos especialistas. Certo é que a rica diversidade regional tende a desaparecer. Por exemplo, os mil queijos artesanais de um país europeu seriam substituídos pelo queijo único pasteurizado...

Retornando ao tema deste artigo, temos, pois, que, pelos fatores acima, a economia moderna ficou sujeita a crises cada vez mais agudas e incontroláveis. E, não nos iludamos: a proliferação de leis e regulamentos num stado totalitário, além de trazer a centralização e a injustiça, não evitará o caos e a pobreza característicos dos países socialistas. Somente a volta à ordem natural poderá salvar a Babel moderna da desagregação e direcionar o mundo para um novo período de progresso material e de verdadeira riqueza.


* Advogado e presidente do Pró Monarquia