segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Entrevista com Dom Luiz de Orleans e Bragança, Chefe da Casa Imperial do Brasil

Os monarquistas brasileiros não constituem, como querem fazer supor alguns, um grupo de saudosistas, fechado sobre si mesmo e incapaz de influenciar os rumos da sociedade.


Desde a queda da "cláusula pétrea", em 1988, o movimento monárquico brasileiro, sob a sábia orientação do Príncipe D. Luiz de Orleans e Bragança, foi progressivamente assumindo um papel discreto, mas de inegável importância no panorama cultural, político e ideológico brasileiro: o de um pólo de pensamento que qualquer pessoa lúcida e imparcial, independente de sua opção política, não pode deixar de tomar em consideração e pesar devidamente.

Assim, é freqüente ser o Chefe da Casa Imperial procurado por jornalistas, e também por brasileiros das mais diversas origens, desejosos de conhecer o pensamento de quem é porta-voz natural da corrente monarquista, sobre temas da atualidade que muitas vezes nem têm realação direta com a questão Monarquia x República.

Um desses temas, que vem preocupando os brasileiros e dividindo as opiniões, é o do Fórum Social Mundial realizado há pouco em Porto Alegre, simultaneamente ao Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça.

Sobre esse assunto D. Luiz concedeu a seguinte entrevista a "Herdeiros do Porvir":

Herdeiros do Porvir: Qual o alcance que Vossa Alteza dá aos dois Fóruns mundiais?

Dom Luiz: Segundo o que a mídia veiculou, em Davos se teriam reunido os propagandistas da globalização, e em Porto Alegre, aqueles que se opõem a ela. Portanto, estaríamos diante dos pró e anti-globalização. Ora, esta visão parece-me superficial. Creio que mais do que uma oposição à globalização, o que os participantes do Fórum de Porto Alegre propuseram foi um outro tipo, alternativo, de globalização. Seriam, pois duas propostas paralelas, rumo à criação de uma ordem mundial, inspirada pelo laicismo, caracterizada pelo nivelamento social, econômico e cultural.

Herdeiros do Porvir: Estamos, então, diante de uma falsa alternativa?

Dom Luiz: Claramente. Aliás, não será a primeira vez na História que isso acontece. No lento caminhar do processo que tem levado à destruição das instituições da Civilização Cristã - lembro aqui de passagem a queda de tantas e tantas monarquias - a opinião pública foi muitas vezes colocada diante de falsas alternativas. Na Revolução Francesa, por exemplo, os jacobinos, quase comunistas, tinham como opositores os girondinos, mais moderados mas igualmente igualitários, entre os quais havia até nobres que chegaram a ser guilhotinados. Mas tanto uns quanto outros desejavam atingir um fim semelhante, só que de formas diversas, devido a inúmeros fatores psicológicos, culturais e até religiosos.

Herdeiros do Porvir: Qual o significado mais profundo do Fórum Social Mundial de Porto Alegre?

Dom Luiz: Para mim, trata-se de uma tentativa de reedição da utopia igualitária, de uma metamorfose, depois do espectacular fracasso da União Soviética. O que me alarma é ver ali exaltados movimentos e personalidades que levam a cabo, em países como a Colômbia, a tentativa de implantação, muitas vezes pela luta armada, de um estado social e político doentiamente caótico e miserabilista. E essa seria a fórmula proposta para toda a América Latina...

Herdeiros do Porvir: O jornal "Le Monde Diplomatique" chegou a afirmar que o terceiro milênio começava em Porto Alegre. Por que essa importância dada a uma cidade sul americana?

Dom Luiz: Creio que não se deve considerar um acaso a realiazação dos Fóruns, um numa cidade suíça, portanto européia, e outro numa cidade brasileira, portanto sul americana. Com a queda do Muro de Berlim e com a diminuição da polarização Leste/Oeste, vai-se tendendo a uma polarização Norte/Sul, que oporia os países pobres, o chamado terceiro mundo (Sul) aos países ricos, Estados Unidos e Europa (Norte). Ora, tal oposição criada artificialmente caracteriza uma espécie de luta de classes a nível de Nações, com a qual não posso estar de acordo.

Herdeiros do Porvir: Como encara o fenômeno da globalização?

Dom Luiz: Considero com apreensão certos aspectos da globalização. As relações humanas são baseadas em laços de afeto, de cultura, de religião, e não apenas econômicos. Ora, o processo de globalização tendo como fator quase exclusivo o econômico, acaba por aniquilar todos os outros, pondo em perigo as culturas regionais e até a soberania das nações.

Herdeiros do Porvir: Quer dizer que no seu entender qualquer comunidade de Nações é prejudicial?

Dom Luiz: Não. Houve até exemplos históricos benéficos. Veja por exemplo o Sacro Império na Europa. Eu mesmo defendi, no Prefácio ao livro "Nobreza e Elites tradicionais análogas", do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, a existência de uma espécie de commonwealth toda ideal, feita de Fé católica, de sentimentos e de cultura, constituída por todos os povos, de diversas raças e nações, que como o Brasil, amam deveras Portugal e falam a língua de Camões.

Herdeiros do Porvir: Diante das incógnitas e perplexidades suscitadas hoje pelo caos social e político, D. Luiz vê alguma alternativa?

Dom Luiz: Muitas pessoas são por demais imediatistas e desejam uma solução mágica e rápida para uma deterioração das instituições e do tecido social que se vem operando há muitas décadas, eu até diria há séculos. Creio que a verdadeira solução é mais profunda. Sendo eu totalmente avesso ao espírito de luta de classes e amigo da hierarquia harmoniosa e equilibrada na organização social humana, penso que é na reabilitação das verdadeiras elites que se encontrará um fator autêntico de estabilidade, pois elas têm uma natural afinidade com as melhores tradições e as aspirações mais profundas do povo e da Nação. Friso, verdadeiras elites e não essas pseudo-elites que adotam para si modos extravagantes e até escandalosos e a quem falta o senso do dever e da dedicação. Ressalto que hoje muitos sociólogos e analistas políticos, sobretudo norte americanos, reconhecem que inúmeras crises com que se debatem as sociedades modernas provêm da ausência ou da omissão das verdadeiras elites.

Herdeiros do Porvir: Isso também vale para o Brasil?

Dom Luiz: Gostaria de chamar a atenção para um aspecto: o Brasil real não é o que os jornais e a mídia em geral nos apresentam. Eu e meus irmãos, que viajamos muito, temos podido conhecer de perto a realidade do Brasil. Aquele Brasil de homens empreendedores, com espírito desbravador, lutando contra as dificuldades naturais mas também contra os imensos ônus que o regime atual lhes põe sobre os ombros e que, apesar de tudo, continuam a fazer o País prosperar. Dou como exemplo, de passagem, a imensa carga tributária que pesa sobre todos os brasileiros. Mas, como dizia, conhecendo essa realidade tem-se esperança no Brasil, porque nosso povo tem dinamismo, tem harmonia social, tem bom senso e sobretudo tem Fé. Creio, portanto, que com a ajuda de Nossa Senhora Aparecida, a quem meu antepassado D. Pedro I consagrou o Brasil, um dia retomaremos as vias providenciais que farão de nós uma grande Nação.

arquivo  HC7K7CP37DMY